terça-feira, 11 de agosto de 2009

Nascido em 4 de julho

Nasci errado, que não queria ter nascido, e fui fruto cirúrgico de algumas camadas de tecido humano dilacerados e pacientemente costurados para minha estréia.

Aos 5 anos eu era uma massa bochechuda e descontrolada de carne, contexto em que fui tragicamente atropelado pelo meu vizinho na rua de casa ao tentar alcançar o outro lado da rua por meus próprios meios, sem sucesso.

Sobrevivente, aos 7 resolvi que seria uma boa idéia unir com um grampo de metal os dois buracos da tomada. Por que separados, afinal? E ganhei uma mão enfaixada pra brincar de múmia.

Tinha um poço em casa onde eu milagrosamente jamais caí, como seria de meu feitio. Gostava de descascar a tinta do muro dos fundos do quintal pra tentar recriar o mapa mundi. Dos mesmos fundos de quintal eu decolei em meu primeiro sonho de voar, entrando pela janela da cozinha e acordando prematuramente por não conseguir desviar da torneira.

Na unica partida de beisebol que disputei na minha vida, busquei obstinado apanhar a bolinha que meu irmão lançou e que encontrou seu destino em minha mão direita, alguns centímetros além da porta de vidro. Para minha infelicidade, a porta estava fechada. Para infelicidade da porta, eu não notei. Como vingança, reduziu-se à pequenos estilhaços que perfuraram impiedosamente a fina pele do meu braço.

Com 8 anos, eu estava confiante de que havia conseguido finalmente montar um videogame à partir da embalagem de meu relógio à prova d'água. Alguns botões desenhados e um recorte pra entrada dos cartuchos e voilà, um videogame construído do zero. Nunca consegui jogá-lo, por motivo de meu pai ter recusado-se a ligá-lo na TV, o que era uma tarefa terrivelmente complexa pra mim.

Começei então a depositar todas as minhas esperanças na promoção do Toddy que sortearia 1 Mega Drive. Eu nunca tinha visto um na minha frente, mas a pequena foto impressa na embalagem do achocolatado me fascinava de uma forma que eu jamais senti de novo. Acordei por repetidas vezes na madrugada e me aventurei sozinho para a escura e colossalmente gigantesca cozinha de minha casa em busca da embalagem que teria a foto do então objeto mais desejado de toda a minha vida.

Esse último episódio marcou profundamente meu caráter, me ensinando que nada se ganha, que o fascínio pode ser perigoso, que os videogames são fantásticos e que o Toddy empelota. Meu Mega Drive veio só no aniversário, mas veio, antes tarde do que nunca, e fui feliz para sempre.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Sono

O sono já penetrou em minha mente e fica deslizando por ela como que nos tubos de um parque aquático. Dentre sonhos que perdi à pesadelos que evitei, mal posso pensar na fofura dos travesseiros firmes e surrados que abandonei na cama antes de sair.

Ficou gravada em pedra na minha memória, fincada nas raízes mais profundas da minha razão, a suavidade dos lençóis que forravam o formidável colchão de molas no qual repousava meu corpo quase defunto antes do despertar estúpido do celular.

Noite antes, bem dormida essa, sonhei feliz uma moça bonita me despertando com um beijo nos lábios, a abertura lenta de minhas pálpebras revelando seu amável rosto, seus olhos azuis, que virou de lado revelando um céu mais azul ainda, que nunca vi, e com um lago refletor de uma paisagem bucólica e com uma silenciosa sonoridade de vento.

Mas a vida não dá trégua: não tracei esse caminho, não terei esse destino. Ao invés da moça, o despertador me beijou de gosto azedo, revelou o teto rebocado de meu quarto, o barulho esclarecedor dos ônibus, o fedor caracterítico das cidades e a desgraça inerente da vida suburbana.

Ó sono, você, senhor da minha vida e provedor de minhas angústias, que me cativa, que me convida pra sair todas as noites e que me deixa sozinho na cama todas as manhãs. Sono que me mata a fome, a sede, a libido. Me leva e trás de toda a sorte de lugares, me dá o gostinho da morte todos os dias.

Sono, pudera eu lhe acompanhar essa manhã.

Resumo da minha vida

Nasci em 4 de julho de 1986, não me lembro.

Aos 5 me atropelei com o carro do vizinho. Aos 6 quebrei a vitrola da sala e culpei meu irmão. Aos 7 eu me jogava no chão pra brincar de plataformer 2D pisando nas paredes. Aos 8 eu estourei a porta de vidro com meu próprio braço jogando baseball e sangrou.

Aos 9 arrebentei meu joelho no chão e minha mãe lavou no banheiro. Aos 10 eu ganhei o mortal kombat 3 na abertura das olimpíadas de Atlanta. Aos 11 eu ganhei meu computador e virei nerd. Aos 12 eu fui sequestrado.

Aos 13 aprendi a violar tocão. Aos 14 eu ganhei dinheiro pra comprar um dvd player. Aos 15 eu conheci a Cynthia. Aos 16 eu estudei no Rei do Mate. Aos 17 eu passei dos 100. Aos 18 eu não passei no vestibular. Aos 19 eu trabalhei construindo engenhocas de telecomunicações. Aos 20 eu estudei e namorei e fui feliz. Aos 21 eu trabalhei pra Opus Dei.

Aos 22 eu comprei um Wii. Aos 23 vou querer comprar um dinossauro.

convite oficial de aniversário

Meu aniversário de 23 anos. Procure ir nos outros 22 antes pra não pegar no meio.

vinte e três

vinte e três ovos na caixa falta um
vinte e três balas de café pra acordar
vinte e três musicas mal cabem num cd
vinte e três casas pra alugar

vinte e três horas é onze
vinte e três anos é tempo
vinte e três reais é dinheiro
vinte e três quilos é peso

vinte e três é primo
vinte e três primos não tenho
vinte e três macacos se reconhecem no espelho
vinte e três crianças dão sussego

vinte e três verrugas nos dedos
vinte e três passagens por subempregos
vinte e três uvas passas no bolo
vinte e três degraus pra chegar no banheiro

vinte e três beatles morreram
vinte e três litros de água de esgoto
vinte e três furinhos tampados no chuveiro
vinte e três pingas de cheiro no bar do seu anísio

vinte e três peças de legos pra montar o sonic
vinte e três filmes com o jim carrey
vinte e três mãos esquerdas não me fariam canhoto
vinte e três vezes morei no alasca

vinte e três carecas desgraçados
vinte e três maria moles descascadas
vinte e três coisas pra fazer ao invés de ir lá
vinte e três motivos pra ser marginal

vinte e três anos morrendo
vinte e três dias correndo
vinte e três minutos escrevendo

Sopa de babaca

Sopa de babaca:

- 1 litro de água.
- 1 kg de babaca.

domingo, 8 de março de 2009

Sobre a vida, a morte e a sorte

O ser humano é caracterizado por seu córtex pré-frontal super-desenvolvido. Por isso possuímos a virtude da razão.

Usando a razão o homem criou o certo, o errado, a culpa, a inocência, os computadores e os blogs. Usando seus instintos o homem criou muitos outros homens, dentre eles eu.

Eu, homem, posso usar minha razão para fazer uma análise racional. A análise racional é possível àqueles que possuem a virtude da razão e, logo, também possuem córtex pré-frontal super-desenvolvido. Eu possuo. Você também.

Não mais do que isso, os homens são todos conseqüências de acasos coincidentes que levaram do calor ao frio, do pó à Terra, da Terra à vida, da vida ao córtex, do córtex ao homem e do homem a outros homens, e de muitos homens ao certo, do certo ao errado, do errado ao culpado, do culpado ao inocente, do computador ao blog.

O homem não nasceu para ser certo, nem para definir o certo. Nasceu para reproduzir-se de forma a passar para frente seus genes, se conseguir. O certo é criado na mente humana e não vive fora dela. O que é certo é certo porque convém a um homem, à alguns homens, ou à humanidade.

Não há certo na natureza, não há nada desta bobagem. A natureza flui inconsciente de seu fluxo, estúpida seguidora de regras matematicamente precisas. Não cede um milímetro às pré-determinações. É previsível, apesar de ser impossível de se prever.

E você é só mais um nó nessa malha da natureza, resultado mais complexo de tudo, mas que não deixa de ser resultado.

Mas é tão incrível para o nosso bom senso assumir que tal complexidade seja obra do acaso, de tão improvável, que muitos se recusam a acreditar. O bom senso falha quando as escalas são diferentes daquelas em que o bom senso foi formado, restrita à nossa vida de alguns anos, à um raio de poucos quilômetros, à experiências limitadas.

O bom senso não crê. Não é útil para nosso córtex pré-frontal levar em consideração probabilidades tão pequenas. Já morreram de fome os homens que esperaram o peixe pular na boca. Mas a probabilidade é astronomicamente pequena, não nula. Penso, logo existo. Existo, logo é possível que eu exista.

Você não soluciona a improbabilidade tirando o acaso da jogada. Se não por acaso, foi planejado. O plano no caso seria tão complexo e improvável que, seguindo esse raciocínio, teria de ter sido criado por alguém. Se foi criado por alguém, estamos falando de razão, que é justamente o que seria tão complexo para ser explicado por um acaso. Então alguém criou o criador. Então alguém criou o criador do criador. E assim por diante.

Não vamos, então, assumir aqui que há um criador para solucionar a improbabilidade da vida, pois já vimos que não soluciona. Vamos imaginar por hora que, sem criador, o universo poderia ter sido do qualquer forma, com quaisquer ou sem regras, com ou sem sentido, com duas, três, onze, treze ou sessenta-e-quatro dimensões, ou sem dimensões, ou sem universo.

Em quais desses universos existiria este blog para conter esta análise? Ou seja, em quais desses universos possíveis, você estaria lá para ver? Certamente não em todos. Talvez em muitos, ou infinitos, mas pelo menos em um: este.

O universo já nasceu improvável, e era de se esperar que ele seria assim. As coisas sempre são do jeito que são. Sempre seriam do jeito que seriam. Sempre seriam de um jeito em detrimento de todos os outros. Sempre seriam improváveis.

Não se assuste se você sentiu dor de barriga às 11h07 da manhã de 18 de agosto de 2008, mesmo sendo a probabilidade de isto acontecer justamente nestas condições seja tão pequena que não existe uma forma de fazer esse número caber na página. Não se assuste se a sua dor de barriga dependeu de toda a história do universo para acontecer: das estrelas, da Terra, da vida, da barriga e, finalmente, da dor.

Não se sinta angustiado se tudo isso é tão maluco que você não entende. Você não nasceu para entender: nasceu para se reproduzir. Não se sinta culpado, não procure o correto, não seja hipócrita. Você está vivo, sabe-se lá como, e pode experimentar coisas. Aproveite sua vida, porque ela está acabando.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Eu tinha que acordar, afinal mexeram no portão. Não é sempre, mas muitas vezes, eu me lembro, mexeram no portão antes de aparecerem aqui para me visitar.

E eu tinha que me preparar para receber, seja qual fosse a pessoa, desconhecida talvez, eu tinha que me preparar. Tinha que buscar meu trunfo, tinha que colocá-lo próximo, eu tinha que ficar pronto. E eu fiquei, mas, desta vez, foi alarme falso.

Iniciou assim mais um de meus dias, iguais, diferentes, não sei, não sou muito apegado ao passado. Vivo assim, um dia após o outro, um minuto após o outro, uma coisa de cada vez.

Me deu fome, fui atrás de um pouco de comida. É o que eu faço quando tenho fome. Minha vida não é difícil, materialmente. Quando quero comida, eu tenho comida. Quando quero água, eu tenho água. Quando quero sossego, bem, nem tanto, mas não posso reclamar também.

Comi algo e fui deitar. Minha cabeça não é tão ativa assim, não me torturo em pensamentos ou me canso de não fazer nada. Eu só fico observando, relaxado, as pernas indo e vindo, os sons que me cercam, os cheiros, as cores.

Tenho distrações bem mundanas. Correr, pular, me esforçar, me cansar até por a língua de fora. Não me enjôo disto, hoje foi legal, amanhã será também, por que não? Por que eu deveria deixar de gostar de algo só por que já fiz demais. Eu não preciso de surpresas, eu não preciso de novos desafios: eu só preciso correr, pular e cansar.

É bobagem pensar no futuro, ele não existe ainda. Não vou conseguir prevê-lo, não há por que me incomodar. Se não tiver água amanhã para eu beber é problema pra amanhã! Hoje tem água fresca, da qual tomo um belo gole depois de um bom e cansativo jogo de bola.

Conhecer um lugar novo, experimentar, descobrir coisas novas, também faz minha cabeça, claro. Sou curioso, mas não penso a respeito, apenas experimento, apenas sinto os sabores, admiro a vista, aprecio o vento que bate no meu rosto.

Não sei se vou viver pra sempre, não sei o que é viver, não me questiono sobre o que tem antes, o que vem depois, por que veio, pra onde vai.

De vez em quando eu brigo com as pessoas. Eu preciso brigar, eu sinto isso, mas não me sinto bem ao brigar. Mas já que tenho que brigar, eu brigo. Preciso defender as coisas, tomar posse delas, é importante por um motivo que desconheço, mas é. Então brigo. Mas não é carregado de ódio, é só por brigar. Passado um instante e já estou calmo, não lembro de mais nada.

Antes todos fossem assim. Antes lembrassem sempre da futilidade das brigas, da mediocridade de suas palavras, da insignificância de seus egos. Lembrassem sempre que não existe importância em nada. Não tivessem inventado tantas coisas que não precisam, não tivesem tido tantas idéias, não tivessem feito tanta bobagem.

Que todos pudessem sair, correr, pular e sentir o frescor da manhã, o vigor da tarde e a serenidade da noite. Deitar no chão gelado no calor e se enrolar no cobertor no frio.

E que fosse tudo simples assim.

Piorador

Tropeçar 

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Como não ser engraçado em 10 passos

Antes de iniciar o artigo quero ressaltar que não me responsabilizo se ao final da leitura você descobrir que você não é engraçado. Afinal, você não deve ser mesmo. Mas tudo bem, você ainda pode ser um doutor, padre ou policial que vai contribuir com sua parte para o nosso belo quadro social.

Apresento a vocês o guia definitivo de como não ser engraçado, siga todas as recomendações e não divirta-se!

1. Tentar ser engraçado



Seria um caminho muito fácil se para ser engraçado bastasse tentar com muito empenho. Sem otimismo, sem auto-ajuda, sem papo de psicólogo, todos nós sabemos ou descobriremos um dia que tentar é o primeiro passo para o fracasso.

2. Encher a cara



Beber torna tudo engraçado - para o bêbado. Se quiser ser engraçado não beba, dê bebida aos outros.

3. Cantar Mamonas



É uma piada repetida há 13 anos que tem cheiro de presunto.

4. Imitar viado



Só funciona se você estiver bêbado, louco, ou se for bicha mesmo.

5. Feira da fruta



O vídeo da feira da fruta reduz o humor de um ser humano a 4 ou 5 frases sobre a tia do bátima.

6. Bunda



Se você falar "bunda" mil vezes, não vai ser engraçado. Se você mostrar a bunda, não vai ser engraçado. Se você colocar fogo na sua bunda, vai ser engraçado, mas vai doer pra caralho.


7. Contar piadas
A piada pode até ser engraçada, mas eu aposto que você não sabe contar, aposto que eu já conheço a piada e aposto que você leu em um e-mail e deu forward para mim.


8. Ser feio
Tem gente feia que é engraçada, mas não é seu caso.


9. Ser machista


Além de não ter graça, você não vai comer ninguém.

10. Ter um blog

Autoexplicativo.

sábado, 17 de janeiro de 2009

O prato, o irmão e o título sem criatividade

Na TV passava alguma coisa sobre guerras, petróleo ou Faustão. Não lembro ao certo, mas não importa. Mas foi assim que começou naquele domingo.

Antes de continuar, devo esclarecer que eu sou um sedentário hiperativo. É assim: fico o dia todo no sofá, mas não paro de me balançar a perna e rodar almofadas no ar. Já meu irmão é um sedentário hipercrítico. Também fica o dia todo no sofá, mas não para de criticar, fazer bravatas e apontar.

Era Domingo, mesmo. Eu estava com um prato na mão e o rodava em substituição da almofada ausente. Tinha acabado de almoçar um farto prato de comida-sei-lá-qual que caiu ploft no meu estômago. Estava farto e cansado.

Rodar um prato, ou uma almofada, ou mesmo morder um pedaço de plástico é terapêutico para mim. Combate o tédio, ocupa o cérebro de pensar bobagem, evita atrofia dos meus músculos e irrita meu irmão.

Divido meu cérebro em dois setores: o setor que eu comando, o sedentário, e o setor aleatório, o hiperativo. O setor aleatório joga uma moeda ao ar e decide: cara - balançar a perna; coroa - rodar almofada. Na ausência de almofada, ele escolhe um objeto quebradiço qualquer que esteja próximo. Foi a vez do prato.

E não podia passar batido aos olhos de meu irmão. Ele foi ficando gradativamente mais puto. Uma raiva que o preenchia, inchava, quase que prendia sua respiração.

O prato, o irmão, o prato, o irmão, o prato rodando, o irmão ficando puto, e mais puto, e ficando vermelho, e o prato rodando, e aquilo ia sufocando ele, e o prato continuava rodando, e o irmão reputo, e o prato girava voltas francezinhas no ar de outono, e o irmão ia bombando resmungante de panela de pressão, soltando um ventinho pela tampa antes de explodir tudo. O prato rodava - o irmão emputecia-se. O prato girava. O prato rodava. Roda prato, roda.

"Dieeeeeeeego!" - gritou! E o tempo parou - silêncio! Foi um pequeno solavanco no continuum, engasgada de CD riscado. Mas logo continuou: "você... vai... QUEBRAR... OOO PRAAA-TOOOOOOO!".

E seguiu o silêncio. Nesse momento o prato pensou: "Oh meu deus! Foi alguma coisa que eu fiz?" - e por pouco não se espatifou em suicídio. Os pássaros pararam de cantar, o dia apagou e desceu por minha garganta um gole de ar seco. Desliguei o setor do meu cérebro responsável pela rotatividade do prato de imediato.

O prato não rodava mais. O irmão fechou a cara confiante da eficiência de seu semblante opressor. Foi o fim do domingo.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Não teve jeito

Foi assim que trilhei meu caminho para o trabalho hoje de manhã. Era 12h e fazia um calor injusto. Completamente injusto. Mas não teve jeito, eu tinha que ir, eu tinha que estar lá fazendo todas aquelas coisas pois me pagam com dinheiro.

E não é comum pagarem você com dinheiro. Tinha que aproveitar, pois paradoxalmente é com dinheiro que eu vou ter que pagar todas as coisas. Todas elas, todas são trocadas por dinheiro. Troca-se comida por dinheiro, carros por dinheiro, casas por dinheiro, extração de dente se paga com dinheiro, batatas se consegue com dinheiro, repolhos, bolinhas de gude, pijamas, carneiros, papel, e toda sorte de coisas que gente que tem dinheiro tem, são pagas com o dinheiro.

Se não tiver dinheiro, ai você não terá nenhuma dessas coisas. Não importa mesmo quanto importantante seja para você, não importa se vai valer sua vida, não importa se você der sua palavra, sua roupa do corpo ou seus dentes. Sem dinheiro, sinto muito, não vai ter jeito.

E não teve jeito. Cheguei ao trabalho e trabalhei. Trabalhei a tarde toda, não vi o sol se pôr, saí só de noite. Passei no mercado, comprei pão, queijo, coca e alface e paguei com dinheiro. E estava um trânsito justo. Mas o ônibus estava injustamente cheio. Não tenho dinheiro para vir pra casa sentado.

A alface ficou meio amassada da viagem, mas a coca não. Já me alimentei dela, já me hidratei dela e já estou cansado.

Meu dia já acabou e amanhã será outro igual - eu vi na previsão do tempo. Então, se eu não postar nada aqui, é só ler este post de novo.